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A penhora do bem de família no processo de execução

O processo de execução possui o objetivo primordial de, utilizando-se dos meios necessários e possíveis, satisfazer o crédito devido ao exequente, da maneira mais célere e menos onerosa a ambas às partes.

Sua função nada mais é que executar um direito reconhecido. Para efetivar esse direito, buscou-se um procedimento que atendesse as necessidades do credor com eficiência: trata-se da penhora, que hoje, é medida cabível para o sucesso do processo de execução.

A princípio, a penhora é medida utilizada nos processos de execução, de forma que o magistrado determina que o bem seja retirado da posse do devedor, e em momento oportuno busca realizar a alienação, a fim de realizar o pagamento da dívida para com o seu credor.

Segundo Didier, a penhora desempenha três funções na execução, que são: a) a individualização e apreensão do bem; b) o depósito e conservação do bem; c) a atribuição do direito de preferência ao credor penhorante.

Conforme o artigo 790 do CPC, podem ser penhorados os bens integrantes do patrimônio do devedor ou dos terceiros responsáveis. Trata-se de uma consequência da responsabilidade patrimonial primária e secundária.

Contudo, a legislação, apresenta exceções à penhora. Além da exigência de valor econômico expressivo, uma vez que a função da penhora é garantir a satisfação do crédito, existem também casos de impenhorabilidade previstos no artigo 833 do CPC e na legislação extravagante. É, por exemplo, o caso da impenhorabilidade dos bens de família.

Neste ponto, convém tecer algumas observações acerca da diferença entre a proteção conferida ao bem de família na Lei nº 8.009/90 e aquela prevista no Código Civil.

O chamado bem de família convencional ou voluntário está previsto nos arts. 1.711 e seguintes do Código Civil e diz respeito à possibilidade de os cônjuges ou a entidade familiar, mediante escritura pública ou testamento, isentar imóvel urbano ou rural utilizado como residência da família da execução por dívidas posteriores à sua instituição.

A instituição voluntária do bem de família deve ser realizada de boa-fé, evidenciada pela solvência do instituidor, sob pena de não se reconhecer o benefício da impenhorabilidade, conforme disposto no art. 4º da Lei 8.009/90.

Além disso, o bem de família voluntário não pode ultrapassar o limite de 1/3 do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição.

É importante observar também que, ao tempo da instituição, o imóvel deverá estar livre e desembaraçado de qualquer ônus e que a instituição ocorrerá por escritura pública ou testamento, devendo ainda haver registro no CRI da circunscrição do imóvel (art. 167, I, nº 1, da Lei 6.015/73). Caso a instituição do bem de família voluntário ocorra em virtude de ato de última vontade (testamento), o bem será registrado com a apresentação do formal de partilha.

Já o bem de família legal, é disciplinado pela Lei 8.009/90, na qual se impõe uma impenhorabilidade legal e involuntária do imóvel residencial, independente de inscrição no CRI.

Para mencionada legislação, os bens de família, portanto, são aqueles integrantes da residência familiar de pessoas casadas, solteiras, divorciadas e viúvas que incluem o prédio residencial urbano ou rural, com suas pertenças e acessórios, destinado ao domicílio familiar, podendo abranger valores mobiliários, cuja renda será aplicada na conservação do imóvel e no sustento da família.

Além disso, pode englobar a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional e os móveis que guarnecem a casa, desde que quitados.

Nota-se, portanto, que a impenhorabilidade do bem de família legal decorre do respeito ao direito de moradia previsto no artigo 6º da Constituição Federal, bem como ao princípio da dignidade da pessoa humana previsto no inciso III do artigo 1º da Carta Maior.

Ou seja, a execução não deve levar o executado a uma situação incompatível com a dignidade humana. Não pode a execução ser utilizada como instrumento para causar a ruína, a fome e o desabrigo do devedor e sua família, gerando situações incompatíveis com a dignidade da pessoa humana.

Não pode, portanto, a pretensão de ressarcimento econômico através do processo de execução se sobrepor às garantias da existência digna e servir como instrumento de flagelo do devedor, posto que lhe deva ser assegurado os direitos básicos outorgados por lei, como o direito a ter moradia e, principalmente, o direito a ter uma vida digna.

Faz-se necessário destacar, ainda, que impenhorabilidade do bem de família poderá ser mitigada quando o imóvel garantir dívidas anteriores à sua constituição, ou em casos de dívidas provenientes de tributos relacionados ao próprio imóvel ou de despesas condominiais, nos termos do art. 1.715 do Código Civil.

O Superior Tribunal de Justiça – STJ, também possui entendimento de que a proteção legal conferida ao bem de família poderá ser afastada quando, a) restar comprovado no processo a alienação de bens em fraude contra credores; b) a alienação de todos os bens do devedor, menos de um durante o curso de processo que poderia leva-lo a insolvência; c) a transferência de imóvel residencial da família no tramite de execução em face de casal para a cunhada e irmã dos devedores; d) a doação ao filho menor impúbere, que sequer havia interesse na realização do negócio, de modo a ocultar o patrimônio dos patriarcas no registro de imóveis; e) a alienação fiduciária do bem de família para garantia de contrato, sendo alegado pelo devedor, após o inadimplemento do negócio jurídico, a impossibilidade de venda ou leilão do imóvel haja vista sua impenhorabilidade.

Diante de tal entendimento da Corte Superior, não há como duvidar que a impenhorabilidade do bem de família é uma garantia, mas que, todavia, deve ser interpretada e analisada de acordo com a cláusula geral de boa-fé, sob pena de afastamento da proteção com fundamento no abuso de direito.

Não se pode permitir, portanto, que se valendo da proteção dada pelo Código Civil e pela Lei 8.009/90, o devedor pratique atos tendentes a inviabilizar a tutela executiva do credor, o que implicaria o uso da lei para promover a injustiça e, com isso, enfraquecer, de maneira global, todo o sistema de especial proteção objetivado pelo legislador.

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